© João José Azevedo Curvello (doutorando ECA/USP)
Alvo constante da perseguição dos administradores, a conversa entre empregados, talvez o campo mais fértil da comunicação nas empresas, revelou-se um meio privilegiado de aprendizagem e de circulação de informações. Se para os estudiosos da comunicação organizacional essa constatação não constitui novidade, para os administradores, entretanto, só agora o tema ganha corpo.
Em texto anterior (Curvello,1997), já apresentávamos o livre trânsito de informações e a comunicação plena como instâncias construtoras de uma organização qualificante. O pesquisador francês Philippe Zarifian também tem batido na mesma tecla. No seu livro mais significativo sobre o tema do aprendizado nas organizações, Trabalho e Comunicação (1996, PUF) , Zarifian volta a tratar da ação comunicativa como instância de socialização e aprendizagem, e conclui que é a comunicação que se realiza entre os empregados que os qualifica para enfrentar os imprevistos do trabalho e a aprender com estes.
Antes, os pesquisadores canadenses Chanlat e Bedard (1992, Atlas), no livro O Indivíduo na Organização, já discutiam a palavra como uma ferramenta do executivo, ao mesmo tempo que criticavam os obstáculos ao diálogo no ambiente de trabalho.
Outro pesquisador, Omar Aktouf (1996, Atlas), no livro A Administração entre a Tradição e a Renovação, também critica a forma como vem sendo teorizada e praticada a comunicação nas organizações: muito mais como um instrumento de transmissão unilateral de informações e de controle, do que instrumento de diálogo e de participação.
Um exemplo prático disso ocorreu recentemente em um dos maiores bancos brasileiros. Na tentativa de controlar a livre troca de informações, entendida, ainda, como desperdício de tempo e de recursos de sistema, implementaram reformas no sistema de correio eletrônico, impedindo que as mensagens possam ser retransmitidas, limitando o número de linhas para os textos, deletando as mensagens após alguns poucos dias, burocratizando o envio de mensagens oficiais (que só podem circular pelas caixas postais autorizadas), entre outras medidas "saneadoras". Para os administradores dessa empresa, a "conversa" eletrônica também era vista como "perigosa" para o bom andamento dos serviços.
Porém, um estudo desenvolvido junto a mais de mil empregados de sete empresas norte-americanas, recentemente divulgado (veja integra da matéria ao final), atesta que a conversa entre empregados, antes de ser "perigosa", "dispendiosa", entre outros adjetivos comumente usados por administradores, é, sim, uma instância de aprendizagem. É no momento da conversa informal, geralmente levada a cabo nos corredores ou nos espaços de lazer, como as lanchonetes, que os trabalhadores (70%, segundo o estudo) discutem assuntos relacionados ao trabalho, trocam experiências e aconselham-se mutuamente. Enfrentam os imprevistos e repartem as soluções. Em resumo, interagem. E, por fim, aprendem. Muito mais do que em treinamentos formais, deslocados do ambiente e da cultura do trabalho.
Aos administradores, vale o recado do diretor de treinamento de uma das empresas pesquisadas: "mantenham a mente aberta, deixem que as reuniões informais continuem, não atrapalhem".
Leia a seguir a íntegra da matéria publicada no Correio Braziliense, caderno de Economia & Trabalho, página 17, no dia 08/01/1998.
Bate-papo qualifica os trabalhadores
Conversas entre colegas no corredor ou na lanchonete são mais eficientes do que as sesões de treinamento, diz estudo americano.
Nova York - Uma chance de encontrar o colega no corredor. Ou uma rápida visita. Para o chefe, pode parecer que o empregado está matando tempo. Mas os empregados sabem melhor: na maioria das vezes eles aprendem mais conversando no trabalho do que em qualquer sessão de treinamento. A conclusão é de um estudo realizado durante dois anos com recursos do Departamento de Trabalho do governo dos Estados Unidos. O levantamento mostra que os empregados aprendem a maioria das coisas que sabem na correria, e, na maioria das vezes, com seus próprios colegas.
"As companhias não prestam atenção a isso, porque é uma parte invisível do trabalho das pessoas", disse Betsy Brand, sub-diretora do centro de Desenvolvimento da Força de Trabalho, que participou do estudo: "Esperamos que os administradores prestem atenção ao aprendizado que está acontecendo", acrescentou.
A maioria das companhias se dá conta de que numa economia de serviços e informação, o capital intelectual pode ser a vantagem necessária sobre os competidores. Assim, para educar melhor seus empregados, injetam dinheiro em treinamentos formais, gastando até US$ 50 bilhões por ano nesses programas, segundo o Departamento de Trabalho. No entanto, o estudo descobriu que 70% do aprendizado é informal. Na fábrica da Siemens, na Carolina do norte, nos Estados Unidos, o aprendizado informal ocorria sem que os chefes se dessem conta. Eles sacudiam as cabeças e buscavam encontrar meios de deter os empregados de se reunir tantas vezes na lanchonete da companhia.
Mas os pesquisadores descobriram que a lanchonete era, na realidade, oprincipal local de aprendizadgem, afirmou Barry Blystone, diretor de treinamento da Siemens. "Achava-se que se falava sobre jogos de golfe ou papo furado", disse. "Mas, o que acontecia era uma enorme atividade relacionada ao trabalho".
Ao descobrirem que a lanchonete era um local de aprendizado, trataram de educar os administradores sobre as reuniões não-oficiais. "Mantenha a mente aberta, deixe que as reuniões informais continuem, não atrapalhe", explicou Blystone.
Na Visteon Automotive Systems, outra das sete empresas que participaram do estudo, os empregados erammandados uma ou duas vezes ao ano para aulas de treinamento formal. Essas sessões duravam de um dia a uma semana. Depois do estudo, a companhia enviará grupos de empregados para o treinamento, em vez de apenas uma pessoa. Eles se ajudam e usam melhor a informação quando voltam à empresa, disse Larry Stewart, diretor de recursos humanos da Visteon, uma fabricante de componentes eletrônicos da Ford.
Numa semana típica, pelo menos 70% dos mil empregados que participaram do estudo disseram que trocam informações com seus colegas. E 55% deles pedem conselhos e ajuda.
Atualizada em: 09/01/98