As mudanças estruturais e processuais implementadas nas empresas de alguma forma as têm forçado a uma maior qualificação. Segundo Fleury (1996b: 188), referindo-se a Philippe Zarifian (1992, 1994, 1995 e 1996), os novos modelos organizacionais podem ser distinguidos entre organizações qualificadas e qualificantes. A organização qualificada se caracterizaria pelo trabalho em equipes ou células; a autonomia delegada às células e sua responsabilização pelos objetivos de desempenho: qualidade, custos, rendimento, etc.; diminuição dos níveis hierárquicos e o desenvolvimento das chefias para as atividades de "animação" e gestões de recursos humanos; a reaproximação das relações entre áreas e funções da empresa.
A organização qualificante, ainda segundo Zarifian, incorporaria outras características além das já citadas: a valorização da aprendizagem e da inovação permanentes; devem ser centradas sobre a inteligência e domínio das situações de imprevisto, que podem ser exploradas como momentos de aprendizagem pelo conjunto dos empregados; a organização deve estar aberta para a explicitação da estratégia empresarial, realizada pelos próprios empregados (...); deve favorecer o desenvolvimento da co-responsabilidade em torno de objetivos comuns, entre as áreas de produção e de serviços (...); deve dar um conteúdo dinâmico à competência profissional, ou seja, permitir que os assalariados invistam em projetos de melhoria permanente de tal modo que eles pensem o seu know-how não como um estoque de conhecimentos a serem preservados, mas como uma competência - ação ao mesmo tempo pessoal e engajada em projeto coletivo (Fleury, 1996b: 189).
Essa visão representa, sem dúvidas, uma evolução aos modelos de treinamento e formatação característicos do taylorismo. Esses modelos reproduziam estruturas que separavam o saber do fazer, o agir do pensar, a partir da idéia de que uma elite pensante (e dominante) poderia atender às necessidades de descoberta e redefinição organizacionais; aos demais, só restava a tarefa de cumprir com o planejado. Também centravam o aprendizado numa dimensão individual. Ainda que a empresa definisse o que deveria ser aprendido, quando e como, esse aprendizado representava um reforço aos currículos individuais. A valorização vinha geralmente do número de cursos e títulos acumulados e não da transmissão e circulação do conhecimento.
Peter Senge (1990), embora parta também do indivíduo e sua busca pelo auto- conhecimento, reforça a necessidade de um raciocínio sistêmico como forma de pensar e aperfeiçoar o todo organizacional. A esse pensamento ele denomina a quinta disciplina (as outras seriam o domínio pessoal, os modelos mentais, o objetivo comum e o aprendizado em grupo), instância integradora que uniria teoria e prática.
Senge e Zarifian diferem, porém, em dois pontos cruciais: para Senge, de tradição norte-americana, a responsabilidade sobre o aprendizado e a mudança organizacional recai cobre o lider, transformado agora em facilitador; para Zarifian (1996), o processo de aprendizado e busca da competência deve basear-se na comunicação. Esse autor trabalha com a teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas, que pressupõe a existência de compreensão recíproca acerca dos fenômenos, e a criação de uma esfera pública, um espaço público no interior das organizações propício ao intercâmbio de informações, percepções, sentimentos e saberes.
Essa proposta, porém, necessita ancorar-se numa cultura organizacional calcada no diálogo e na participação. Nas organizações marcadas pela hierarquia, pelo rígido controle da informação e pela concentração de poder, haveria a necessidade de adaptar suas culturas, e isso nos remete à antiga e polêmica discussão sobre se é possível mudar e gerenciar culturas.
© 1997 Prof. Dr. João José Azevedo Curvello - Ação Comunicativa
Publicada originalmente em: 26/09/97