Este trecho foi extraído do meu artigo Um olhar comunicacional sobre a autonomia e a interdependência nas relações de trabalho, publicado no livro organizado pela professora Margarida Kunsch, A Comunicação como Fator de Humanização das Organizações, editado pela Difusão em 2010 (p. 77-92):
“O conceito de organizações efêmeras aparece pela primeira vez em um ensaio do sociólogo italiano Giovan Lanzara (1983). Ao relatar os processos organizativos emergentes após o terremoto que abalou o sul da Itália em 1980, o autor destaca algumas características e comportamentos próprios dessas organizações, as quais denominou de informais e efêmeras. Por exemplo, seriam marcas desse perfil de organizações a “desafeição psicológica” e a “desconfiança moral e política” (LANZARA, 1983: 75). Conforme destacadas por Andrade (2005, p. 633, citando LANZARA, 1983, p. 88), essas organizações “não têm passado ou futuro, vivem no presente, não contam histórias sobre si mesmas e não projectam a sua imagem no futuro, tudo jogando no presente”.
Uma outra característica desse modelo emergente de organização é que seria também um sistema caórdico, uma espécie de organismo, organização ou sistema auto-regulado que combina de modo equilibrado os estados de ordem e caos. Sistemas assim são estruturados de modo a não ser inteiramente tomados, seja pelo caos, seja pela ordem. São auto-organizados, como o são todos os sistemas do mundo natural. (MARIOTTI, 2007, p.148).
São também estruturas complexas, que não se confundem com complicação nem são transparentes e inteligíveis, mas que só existem a partir da observação, pois “mesmo as relações de trabalho e até aquelas desenvolvidas entre organização e públicos (como sistemas autônomos que são) seriam, antes de tudo, relações de observação, de contraposição, de redução de complexidade” (CURVELLO, 2009, p. 102). Nessa perspectiva, os indivíduos não estariam subsumidos à organização, mas seriam, sobretudo, observadores autônomos, ainda que eventualmente acoplados estruturalmente ao contexto organizacional.
Dessa forma, seja qual for o contexto, nesses tempos típicos de uma pós-modernidade líquida, diluída, quer seja simplesmente o número de opções disponíveis aos indivíduos, ou o leque de stakeholders envolvidos no processo de tomada de decisão, ou ainda o aumento das conexões entre organizações, parece que estamos a entrar numa época em que parcerias e cooperação e a tomada de decisão nos princípios de multiagency (no sentido lato), passa a ser crucial (Taket e White apud JACKSON, 2000, p.335). Assim, as bases terão de ser permanentemente negociadas e renegociadas, numa espécie de busca de um equilíbrio tensionado ou da denominada ordem negociada como proposto por Strauss (apud CARAPINHEIRO, 1993, p. 63).”
Referências:
ANDRADE, Rogério Ferreira de. Quando nos Roubam o Chão Obrigam-nos a Voar: narrativas erosivas e extinção moral das organizações. Lisboa: Actas do 4º. SOPCOM, 2005. Consultado na internet em 17/02/2010, no endereço: < http://www.bocc.ubi.pt/pag/andrade-rogerio-quando-roubam-chao-obriga-nos-voar.pdf >
CARAPINHEIRO, G. Subjetividade e administração de pessoal: considerações sobre modos de gerenciar trabalhos em equipes de saúde. In: EE Merby e RT Onocko. Agir em Saúde: um desafio para o público. São Paulo: Hucitec, 1993.
CURVELLO, João José Azevedo – A perspectiva sistêmico-comunicacional das organizações e sua importância para os estudos da comunicação organizacional. In: KUNSCH, Margarida Maria Krohling. Comunicação Organizacional: Histórico, fundamentos e processos. Volume I. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 91-105.
JACKSON, Michael C.. Systems Approaches to Management. New York: Kluwer Academic/Plenum Publishers, 2000.
LANZARA, Giovan. Ephemeral organizations in extreme environments: Emergence, strategy, extinction, In Journal of Management Studies, 20: 7195, 1983
MARIOTTI, Humberto. Pensamento Complexo: suas implicações à Liderança, à Aprendizagem e ao Desenvolvimento Sustentável. São Paulo: Atlas, 2007.