Sobre interdisciplinaridade e ligação de saberes

João J. A. Curvello | Reflexões,Teorias | quinta-feira, julho 3rd, 2008

Em todos esses anos como professor e pesquisador, trabalho a comunicação como uma disciplina que nasceu e cresceu na interdisciplinaridade. Por isso, tenho lutado por tratar a comunicação social como um campo em que o saber deve ser plural, amplo, diversificado e, por isso mesmo, complexo. Nunca me deixei seduzir pelas idéias reducionistas das áreas profissionais, como jornalismo, RP e PP. Sempre acreditei que o destino da comunicação social era a fusão de saberes e competências. Assim, venho conduzindo minhas disciplinas e minhas pesquisas. E o tempo e os impactos das novas tecnologias, por exemplo, têm provado que meu pensamento estava no caminho certo, apesar do recrudescimento do fundamentalismo corporativo, como o que está sendo engendrado em alguns feudos classistas, que pregam por aí o atrelamento do ensino de comunicação à formação meramente técnica. Os técnicos serão o que sempre foram: técnicos. E o que os espera é o emprego barato das redações ou o desemprego. O mundo de hoje e do futuro está reservado aos pensadores. E é por isso que acredito que um curso de comunicação deve, antes de tudo, levar os alunos a pensar. Por essa razão, prefiro trabalhar no ambiente da complexidade e acreditar que poderemos construir a utopia da ação comunicativa.

Outra questão que precisamos superar, é a crença de que nossa interdisciplinaridade estaria restrita ao campo das ciências sociais. Hoje, muitas das teorias da comunicação se alimentam dos avanços conseguidos no âmbito da física (teoria do caos) e da biologia (teoria dos sistemas autopoiéticos), por exemplo. Como sempre acreditei que a interdisciplinaridade é o caminho, acredito naquelas ciências que não se encastelam nos paradigmas vigentes. A ciência da comunicação é um exemplo disso. Quanto a caminhar juntos na interdisciplinaridade, quero deixar claro que essa palavra não significa trilharmos todos os mesmos caminhos. O saber que chamo de plural se encontra nas esquinas, nem sempre com hora marcada, nem sempre de forma planejada, mas se encontra. E provoca rupturas, provoca revoluções teóricas e paradigmáticas. Quero dizer com isso, que ser interdisciplinar não é pensar igual. Significa, sim, ser diferente e respeitar a diferença, pois só assim é possível estabelecer conexões entre os saberes.

O lema de uma turma de jovens comunicadores de outros tempos

João J. A. Curvello | Reflexões | quinta-feira, julho 3rd, 2008

Este pequeno trecho do poeta uruguaio Mário Benedetti foi escolhido o lema da minha turma de Comunicação Social na Universidade Católica de Pelotas, no longínquo e ao mesmo tempo tão próximo 1984. Encontrei-o hoje, ao rever, em tom já amarelado, o convite de nossa formatura. Traduz o retrato de um tempo sofrido, mas igualmente de insuperável esperança:

“… se uns caminhos se fecham, há que buscar outros. E no caso de que não existam, há que abri-los. Se os censores fecham a imprensa independente, se os canais de comunicação são destruídos, se as vias de informação são tapadas, nada disso deve impedir, contudo, que a verdade assome sua indiscreta presença. Sempre haverá esquinas, muros, pátios, cartazes, plataformas, paróquias, sótãos, terraços, onde escrever o que for preciso. Depois de tudo, se chegamos a uma situação em que a verdade não pode ser difundida por meios mecânicos, sempre nos resta a atração ao sangue.”

Mário Benedetti (poeta uruguaio)

O Medo Global, por Eduardo Galeano

João J. A. Curvello | Reflexões | quarta-feira, maio 21st, 2008

O Medo Global

Os que trabalham têm medo de perder o trabalho.
Os que não trabalham têm medo de nunca encontrar trabalho.
Quem não tem medo da fome, tem medo de comida.
Os motoristas têm medo de caminhar e os pedestres têm medo de serem atropelados.
A democracia tem medo de lembrar e a linguagem tem medo de dizer.
Os civis têm medo dos militares, os militares têm medo da falta de armas, as armas têm medo da falta de guerras.
É o tempo do medo.
Medo da mulher da violência do homem e medo do homem da mulher sem medo.
Medo dos ladrões, medo da polícia.
Medo da porta sem fechaduras, do tempo sem relógios, da criança sem televisão, medo da noite sem comprimidos para dormir e medo do dia sem comprimidos para despertar.
Medo da multidão, medo da solidão, medo do que foi e do que pode ser, medo de morrer, medo de viver.

Eduardo Galeano, publicado em: De Pernas Pro Ar – A Escola do Mundo ao Avesso.

Como construir credibilidade nas relações com a imprensa

João J. A. Curvello | Comunicação Organizacional | sexta-feira, maio 9th, 2008

Atender à imprensa com rapidez, objetividade e honestidade é bom negócio para as empresas.

A imprensa pode não fazer com que os públicos pensem exatamente como desejam seus articulistas, mas consegue nos induzir sobre o que devemos pensar. Esse é o chamado poder de agenda dos meios de comunicação. Uma vez na pauta, um assunto vai repercutir de alguma maneira junto à sociedade.

Há muito tempo, grandes corporações já perceberam as vantagens de estar ao lado da mídia, literalmente pegando carona nas ondas da cobertura jornalística ou por meio da ação estratégica de suas assessorias de comunicação, ao sugerir temas e conteúdos.

Para organizações de menor porte, que nem sempre contam com estruturas formais de comunicação, as relações com a imprensa podem ser tensas por diversas razões. Uma delas pode estar na tradicional aversão à notícia, provocada pelo receio da distorção da informação. A imprensa que hoje pode ser uma aliada na divulgação de produtos e serviços, amanhã pode ser aquela que denuncia alguma irregularidade e expõe as possíveis falhas do negócio. Como confiar, portanto, nos jornalistas?

Primeiro, é preciso entender que atuam sob pressão: correm contra o tempo cada vez mais comprimido, precisam cumprir metas e objetivos e exercem várias funções. Seguem regras profissionais e se baseiam em critérios que definem o que é e o que não é notícia, como representatividade da fonte, número de pessoas envolvidas e alcance social. Às vezes, a inauguração de uma nova loja pode ser a notícia mais importante para a empresa, mas para os jornalistas trata-se de um fato rotineiro que, ponderado com outros tantos fatos acontecidos no dia, de igual ou maior importância, não gera interesse imediato para a sociedade. Portanto, as visões podem ser diferentes. E o que fazer, então, quando a imprensa bate às portas da empresa na busca por informações ou mesmo na tentativa de agendar entrevistas?

Sabe-se que é no espaço editorial de um veículo de comunicação, diferentemente do espaço comercial em que se publicam anúncios, que se constrói a credibilidade. Essa possibilidade de passar pelo crivo da notícia e obter o reconhecimento público pela qualidade de um serviço, por exemplo, certamente será um diferencial competitivo.

Para isso, porém, é preciso primeiro superar a timidez e o medo de se expor, além de evitar dar aos jornalistas um tratamento burocrático ou deixar a imprensa sem resposta. Ainda que não seja oportuno atender ao jornalista naquela hora e instante, pergunte sempre “qual é o seu deadline?” (ou “qual o seu prazo?”). E, claro, receba-o assim que estiver disponível e devidamente preparado.

Outro conselho passa pelo esforço em ser objetivo, sucinto mesmo, quando se fala para qualquer dos meios (rádio, televisão, jornal, revistas, internet). Uma frase curta tem mais chances de ser aproveitada no texto do jornalista do que longos parágrafos e explicações.

Também se aconselha a não discriminar jornalistas e veículos pelo porte do jornal ou da emissora. Todos têm públicos cativos que podem ser afetados pela informação ou pela falta de informação. Outra questão importante é o respeito à verdade, pois como bem lembra Ruy Altenfelder, ex-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial, “quem não diz o que é permite que pensem e afirmem aquilo que não é”.

É preciso, ainda, ter cuidado com alguns mercadores do jornalismo (sim, eles também existem), que literalmente vendem espaços e matérias nos seus veículos. O que pode parecer inicialmente um grande negócio, certamente terá repercussões negativas, porque os públicos sabem muito bem discernir o joio do trigo quando se trata de credibilidade jornalística.

Assim como é possível encantar o cliente com um bom atendimento, esses cuidados ao se relacionar com a imprensa, podem de alguma forma encantar e até mesmo fidelizar o jornalista, de tal maneira que ele voltará a buscar informações. É o momento em que o empresário ou executivo ganha o status de fonte e pode efetivamente posicionar sua empresa como uma organização responsável e comprometida com a ética e a transparência.

Nossa real dimensão

João J. A. Curvello | Reflexões | terça-feira, maio 6th, 2008

Nesses dias, andei um pouco afastado do blog, envolvido que estive em eventos, reuniões, leituras, disputas, discussões. Este post reflete um pouco meu pensamento sobre as lutas de poder, sobre o excesso de importância que damos a tudo o que não vale a pena.

O vídeo acima, realizado a partir de um texto de Carl Sagan, nos apresenta a real dimensão desse pálido ponto azul chamado Terra e de seus habitantes diante da imensidão do universo. Já o vídeo abaixo, traz um rock da década de 80, da banda Uns e Outros, atualizada na versão do Biquini Cavadão, com uma letra que ainda se revela contundente e atual.

Afonso Romano de Sant’Anna: mentes simples e mentes complexas

João J. A. Curvello | Reflexões | sábado, abril 26th, 2008

Este texto foi publicado originalmente na coluna do poeta no Correio Braziliense:

Mentes simples e complexas (Affonso Romano de Sant’Anna)

A mente simples é retilínea, plana.
A mente complexa é curva, elíptica.
A mente simples acredita que somando dois com dois vai chegar ao quatro.
A mente complexa sabe que somando dois com três pode chegar a vários resultados, até mesmo, eventualmente, ao quatro.
A mente simples afirma que a linha reta é a menor distância entre dois pontos.
A mente complexa sabe que o universo é curvo e que, portanto, a curva pode também ser a menor distância entre dois pontos.
A mente simples acredita que o que não é branco é preto.
A mente complexa sabe que existe um espectro de cores e é com essa palheta que se chega ao arco-íris.
A mente simples diz furiosa: olho por olho, dente por dente.
A mente complexa pondera como Gandhi, e sabe que dizendo olho por olho acabaremos todos cegos e desdentados.
Lembram-se de quando dividíamos o mundo em esquerda e direita?
Hitler não era de direita nem Stalin de esquerda.
Hitler e Stalin eram mentes perversamente simples.
A mente simples não vê matizes.
É o bem contra o mal, o certo contra o errado, o Ocidente versus Oriente.
O terrorista tem uma mente terrivelmente simples.
O pacifista, até o pacifista, pode ter uma mente desarmadamente simples.
A arte não é uma coisa simples, embora alguns a simplifiquem em receitas, objetos de consumo e marketing.
Bruneleschi e Alberti, que descobriram a perspectiva no Renascimento, não tinham uma mente simples. Goya não tinha uma mente simples. Clarice não tinha uma mente simples. Nem Guimarães Rosa. Bach era simplesmente complexo.
A mente complexa é a que está sempre aberta para novas dimensões. Newton percebeu dimensões novas no universo. Einstein agregou a quarta dimensão. E agora Stephen Hawking nos anuncia que há pelo menos 21 dimensões ou realidades diferentes.
Olhemos a biologia: o ovo não é quadrado. O coração não é retangular. O DNA são espirais que se procuram a si mesmas num interminável balé de curvas.
Olhemos as galáxias. E os ventos. E os vulcões. E as tempestades. Não são simples, não marcham em linha reta.
O amor, ah!, o amor, não é, nunca foi uma coisa simples.

Pesquisa sobre Comunicação Interna

João J. A. Curvello | Comunicação Organizacional | terça-feira, abril 22nd, 2008

A ABERJE – Associação Brasileira de Comunicação Empresarial divulgou no final de 2007 mais uma rodada de sua já tradicional pesquisa sobre a comunicação interna nas empresas. Participaram da amostra 164 das maiores empresas brasileiras.

O interessante dessa pesquisa é a possibilidade de acompanhar a evolução do pensamento estratégico na área e também as mudanças de perfis quanto ao uso das mídias internas, desde 2002, ano da primeira edição.

Você pode fazer o download da versão em PDF neste link.

O clássico termo Comunicação Interna, no entanto, vem sendo questionado em razão das limitações da chamada visão “geográfica” do público e também em função das profundas mudanças nas relações de trabalho. Sobre esse assunto, voltaremos a falar em outro post.

Criatividade e inovação

João J. A. Curvello | Teorias | segunda-feira, abril 21st, 2008

A criatividade é definida, geralmente, a partir de três variáveis.

A primeira, taumatúrgica, a concebe como algo mitológico, milagroso (o fazer algo do nada), associada ao desejo, ao sonho, à esperança. Como nos versos de García Lorca : “todas as coisas têm um mistério / e a poesia é um mistério que tem todas as coisas”.

A segunda variável é marcada pela combinação incomum de lógica e intuição. Normalmente, nas organizações, a criatividade resulta muito mais de um esforço do que de uma habilidade, pois empresas preferem usar o caminho da lógica. Para o professor José María Ricarte, da Universidad Autónoma de Barcelona, a combinação de lógica e intuição poderia ser descrita assim:

    pensamento + idéia + processo + solução = criatividade
    busca + encontro = criatividade
    verdade + beleza = criatividade

Ela resulta da conjunção entre as concepções de Aristóteles (o filósofo da lógica e da busca da verdade) e Platão (filósofo da intuição e da busca da beleza).

A terceira variável encara a criatividade como instrumento de trabalho. Nessa concepção, criatividade resulta de uma atitude de aprendizagem. Como afirmou Kenichi Ohmae, criatividade não é algo que se ensina, mas que deve ser aprendido. Dessa forma, inovar é gerenciar a criatividade, é mudar, é alterar, é introduzir novidades.

Outra boa metáfora para o processo criativo é a da banda de jazz: em que a soma da variedade aparentemente caótica de improvisos gera qualidade musical. O improviso, geralmente visto como risco, passa a ser entendido como uma saudável provocação da individualidade criativa.

Blogs de outras turmas

João J. A. Curvello | Convergência Digital | quarta-feira, abril 16th, 2008

O professor Sérgio Sá informa que os blogs (blogues?) das turmas de Técnicas de Produção Jornalística 3 (opinião), da UCB, estão a pleno vapor.

Se tiverem um tempinho, entrem, confiram, opinem. E divulguem.

http://opinativo.wordpress.com (turma da manhã)

http://refeito.wordpress.com (turma da noite)

Uma aula de jornalismo

João J. A. Curvello | Teorias | terça-feira, abril 15th, 2008

O professor Manuel Carlos Chaparro, da ECA/USP, dá uma verdadeira aula ao explicar a cobertura jornalística do caso Isabella.

Vale a pena conferir esse e outros vídeos, além dos primorosos textos, no blog O Xis da Questão.

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